Educação integral

Anísio Teixeira: pintura do grafiteiro baiano Thito Lama

Anísio Teixeira: pintura do grafiteiro baiano Thito Lama

O post “Educação integral/O legado de Anísio Teixeira” é título da matéria da jornalista carioca Andréa Antunes, publicada na Folha Dirigida, Caderno de Educação, edição de 27 de maio a 2 de junho de 2010. O grafiteiro Thito Lama,  residente em Salvador (BA), foi o autor da pintura (foto) de Anísio Teixeira, exposta na área externa da Escola Classe I/Centro Educacional Carneiro Ribeiro (CECR), no bairro do Pero Vaz. Leia abaixo na íntegra a matéria com a entrevista do diretor da Escola Parque/CECR, professor Gedean Ribeiro:

O LEGADO DE ANÍSIO TEIXEIRA

Uma escola com educação integral e não com tempo integral. Essa é a filosofia da Escola Parque, em Salvador, que este ano completa 60 anos de fundação e mantém vivo o ideal de sua fundador, o educador Anísio Teixeira.

 “Nossos alunos fazem o curso regular em uma das Escolas Classes e depois, vêm para a Escola Parque fazer oficinas de música, teatro, esporte. A diferença é que, aqui, as aulas regulares, oficinas e outras atividades são integrados no mesmo projeto. Este ano, o tema é ‘Educação, Arte, Ciência, Esporte e Novas Tecnologias’. Nas escolas com tempo integral, o aluno fica na escola e faz outras atividades no contraturno, mas essas atividades são isoladas, não têm ligação com o projeto pedagógico, o que é uma realidade aqui na escola Parque”, explica Gedean Ribeiro, atual diretor da Escola Parque.

 Para o diretor, a educação integral é um dos principais legados deixados por Anísio Teixeira, morto em 1971 e um dos principais educadores do país. Ele defendia a escola laica, pública e obrigatória. “Ele queria formar o homem integral e, para isso, não basta oferecer apenas o ensino regular”, diz Gedean. Fundada em 1950, a Escola Parque faz parte de um complexo formado por quatro escolas-classe (escolas de ensino regular). O Colégio Estadual Álvaro Augusto Silva, Escola Estadual Anísio Teixeira, Escola Candolina e Celina Pinho. A escola tem hoje cerca de três mil alunos, em sua grande maioria oriundos de bairros pobres da cidade. Na Escola Parque, que funciona apenas nos turnos matutino e vespertino, os alunos do complexo educacional complementam, no contraturno, sua formação por meio de oficinas e outros recursos sócioeducativos.

 “A escola oferece vivências através de seus núcleos, os quais possibilitam uma ressignificação e complementação das disciplinas curriculares oferecidas no núcleo comum das Escolas que fazem parte do complex o como atividades de informática, leitura, raciocínio lógico, língua estrangeira, entre outras”, diz o diretor.

 Inspirado no ideal de Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro fundou nos anos 80 os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps), no Rio de Janeiro. Como a Escola Parque de Anísio, os Cieps deveriam oferecer uma educação integral. “Temos um problema de descontinuidade. Cada governo faz um novo programa. Por isso, os Cieps perderam sua característica inicial”, diz a professora Amerisa Resende, integrante da União dos Professores Públicos no Estado do Rio de Janeiro (Uppes Sindicato).

 Para Amerisa, Anísio Teixeira inovou ao defender a necessidade do professor conhecer as condições do aluno. “Essa é uma ideia que todos os professores hoje devem ter em mente. Além disso, ele mostrou também a importância da prática, da vivência. Essa é ideia cada vez mais presente nas escolas e na formação dos professores”, avalia a professora.

 O ALUNO COMO SUJEITO

Doutora em Educação e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Suzana Saraiva diz que uma das grandes inovações do educador foi colocar o aluno como sujeito do processo educacional. “A compreensão de Anísio sobre a escola, inscrita não só no Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova como em toda a sua obra e vida pública, desde o tempo em que foi diretor da instrução, de 1924 a 1929, na Bahia, traz como uma das principais inovações a concepção do aluno como sujeito e não mais como objeto da aprendizagem. Nesta perspectiva, ele não considera a função educacional como uma função de superposição ou de acréscimo, segundo a qual o educando é ‘modelado exteriormente’ (escola tradicional), mas uma função complexa de ações e reações em que o espírito cresce de dentro para fora”, explica Suzana Saraiva.

 A educadora ressalta, também, que um dos pontos mais marcantes do projeto pedagógico da Escola Parque de Anísio Teixeira foi assumir uma postura de permanente reflexão.

 “Outro aspecto que deve ser destacado é a sistemática de avaliação adotada que, coerente com a perspectiva da educação integral, não se atém exclusivamente à avaliação tradicional (provas, notas e assim por diante), mas privilegia a postura pedagógica do ‘aprender a aprender’, em outras palavras, o desenvolvimento das competências cognitivas do educando, modernamente defendido, entre outros, por Phillipe Perrenoud”, destaca a professora.

 Na opinião de Suzana Saraiva, a filosofia de Anísio Teixeira está impregnada em inúmeras escolas espalhadas por todo o país. Mas, apesar desta influência, boa parte das escolas privadas ainda continuam adotando uma proposta tradicionalista de ensino, principalmente no ensino médio, onde o principal foco são as provas do vestibular.

 “Desta forma, uma educação mais ampla, que instrumentalize o educando a pensar e viver o mundo em constante mudança fica totalmente fora de questão. Entrar na universidade termina sendo o grande objetivo, mas e a permanência na mesma? Um lamentável aspecto, cada vez mais crescente em nossas estatísticas, é a evasão no ensino superior público. Recentemente, eu e o Prof. Dr. Máximo Masson, ambos do quadro permanente da UFRJ, realizamos uma pesquisa sobre permanência e evasão entre estudantes na Escola Politécnica da UFRJ, escola de reconhecida excelência na América Latina e de difícil ingresso, que veio a demonstrar o quanto, apesar de algumas tentativas didaticamente inovadoras, o tradicionalismo pedagógico continua sendo dominante com todas as conseqüências negativas que se reproduzem quase perenemente. Neste sentido, a proposta pedagógica da Escola Parque é notável”, elogia.

 No que concerne ao ensino público em geral, a especialista diz que o problema é basicamente a questão da qualidade. “Substituir o investimento na qualidade do ensino básico por artifícios variados não levará a nenhum resultado diferente do que temos hoje. Podemos dizer que, neste sentido, a Lei 9.394/96 proporcionou um grande avanço no que diz respeito à formação de professores para as séries iniciais a elevar sua preparação ao ensino superior, mas ainda existe um longo caminho a ser percorrido. Certamente se nos ampararmos nas concepções dos educadores de qualidade que nosso país já produziu (e produziu de forma farta) poderemos dar um rumo melhor à educação brasileira”, avalia Suzana Saraiva concluindo que os ideais de uma escola pública, laica e obrigatória, defendidos por Anísio Teixeira, ainda não forma integralmente alcançados.

 “Embora a questão da universalização da educação no Brasil já esteja equacionada, enquanto pública, laica e gratuita, tendo por base a coeducação, terminou por ficar ainda pouco contemplado outro dos pilares básicos da concepção de Anísio, que é a escola de qualidade. Lamentavelmente ainda precisamos trilhar um caminho mais longo não só no sentido de uma maior consistência na formação de professores não somente do ponto de vista pedagógico, mas também no sentindo de enfrentar os mais diversos problemas, como bullying e síndrome de Bournout, tão em voga no momento, como também na questão salarial.”

A Escola Parque

 O Centro Educacional Carneiro Ribeiro – Escola Parque funciona em uma área de 42 mil metros quadrados na Bahia. Idealizada por Anísio Teixeira, então secretário de Educação e Cultura de Salvador, a escola foi fundada em 1950 com a proposta inovadora de oferecer uma educação integral. Ela nasceu para ser modelo de outras que seriam construídas em seguida em outras áreas carentes.

 De acordo com o atual diretor da Escola Parque, Gedean Ribeiro, até 1974 a escola cumpriu bem o seu papel. A partir daí passou por dificuldades e teve desvirtuado o seu objetivo.

 “Houve um período em que foi transformada em escola de aceleração (para jovens e adultos). Essa fase ruim foi até o final dos anos 90. Em 2000, o governo reinaugurou a escola, que voltou a defender os ideais de seu fundador. Hoje, buscamos formar o homem pleno, como desejava Anísio Teixeira”, diz Gedean Ribeiro, que acredita que nos últimos oito anos, a educação melhorou.

 “Se avaliarmos de forma global, geral, acredito que houve uma melhora. Hoje temos inúmeros indicadores que mostram que os resultados estão melhorando. É claro que estamos longe do ideal e que se formos olhar alguns municípios, aqueles mais distantes, veremos que a situação não é boa. Falta tecnologia, recursos e até profissionais qualificados.”

 Definindo Anísio Teixeira como um dos maiores revolucionários de todos os tempos, Gedean diz que é impossível dizer se Anísio estaria satisfeito com a educação nacional. “O novo para ele hoje já é velho. Todo o seu legado é dentro de uma concepção futurista. Ele sempre estava vendo algo em que era possível melhorar.”

andrea.antunes@folhadirigida.com.br

www.folhadirigida.com.br

 

2 comments for “Educação integral

  1. Henrick
    9 de junho de 2010 at 20:43

    Tenho passado pela Paralela e me deparado com artes incriveis…estou a procura dos autores…tem um ki assina “tfc” dono do personagem Pinel…como entro em contato ?
    Já vi trabalhos em paredes de escolas tamb =]
    Responde pelo email
    Vlw!

  2. Sandra
    5 de junho de 2010 at 13:43

    Penso que é preciso fazer educação pensando nela como um processo, mas é preciso realizá-la de forma conjunta. A LDB 9394/96 traz no seu contexto uma nova perspectiva de educação, os PCN compreendem o professor como mediador e o aluno como sujeito do processo, assim como pensou Anisio Teixiera décadas atrás. Num processo de modernização acelerado que a sociedade hodierna vem passando a educar tem que ser uma ação contextualizada. O professor deve assumir o perfil de pesquisador e conhecer o “seu” aluno, a realidade na qual está inserido, compreender como ele aprende e como vê o mundo. Não dá pra ser diferente!
    A Thito e a toda galera do Salvador Grafita nosso carinho enorme e desejos de muito mais SUCESSO!
    Soteropólis está cada dia mais bonita de ver, pois para qualquer lado que olhamos vemos Arte Grafitada!
    Pana, te amo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

    Sandra Leal
    Coordenadora Pedagógica da Escolinha de Futebol Nelson Leal

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