Arte, cultura e lazer atravessando o sertão baiano, sergipano, alagoano e pernambucano II

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Intervenções artísticas de Chucky e Lucas no centro da cidade de Paulo Afonso

Nos dois dias de permanência em Paulo Afonso dividi a programação com a visita ao Complexo Hidroelétrico da Chesf – Companhia Hidroelétrica do São Francisco, um dos maiores parques de energia da América Latina, conhecer as cidades de Delmiro Gouveia e Piranhas (Patrimônio Histórico Brasileiro), em Alagoas, o Museu de Arqueologia de Xingó, em Sergipe, e fazer um passeio pelo Cânion do rio São Francisco, no povoado Rio do Sal, município de Paulo Afonso, na Bahia.

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Ponte construída sobre o Rio São Francisco liga os estados baiano e alagoano

Por conta do feriado junino não rolou a Chesf. Então iniciei por Delmiro Gouveia, distante 43 km do centro de Paulo Afonso. Segui pela BA-210/BR-423, atravessei a ponte D. Pedro II, construída no governo do presidente Juscelino Kubitschek – famosa ponte metálica de Paulo Afonso que cruza o Rio São Francisco -, que faz divisa com os estados da Bahia e Alagoas. Saindo da ponte cheguei até o entroncamento da BR-423/AL-220, à esquerda da rodovia e, minutos depois entrei na cidade de Delmiro Gouveia.

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Frase de autoria desconhecida na entrada da cidade

O primeiro nome dado à cidade de Delmiro Gouveia foi Pedra e o povoado se constituiu a partir de uma estação da estrada de ferro. A denominação Pedra veio de grandes rochas que existiam junto da estação.

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Montagem de um cenário com a foto de Delmiro Gouveia e os produtos (couros e linhas) origem da sua fortuna

Tudo começou no ano de 1903, com a chegada do cearense Delmiro Augusto da Cruz Gouveia, que se estabeleceu vendendo couros bovinos e peles de caprinos. Ele também instalou uma fábrica de linha, atraindo para região muitos moradores e trazendo grande desenvolvimento para a região.

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Igreja de Santa Rita

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Nova igreja matriz de Nossa Senhora do Rosário

Delmiro fez fortuna no sertão alagoano, e apenas com meios próprios construiu a primeira hidroelétrica do Brasil – Usina de Angiquinho -, com maquinário trazido da Europa. A história da cidade registra como fato importante a visita do Imperador D. Pedro II à cachoeira, em outubro de 1859 e assinalada por um marco de pedra, erguido no local.

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Museu Regional Delmiro Gouveia funciona na antiga estação ferroviária Pedra

Quem quiser conhecer um pouco mais sobre a história de Delmiro Gouveia deve visitar o Museu Regional de Delmiro Gouveia, que funciona na antiga estação ferroviária Pedra, construída por D. Pedro II, em 1878.

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Clécio mostra painel com fatos da vida pessoal de Delmiro Gouveia

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Iamani (blusa azul) e Irani posam ao lado de uma antiga escrivaninha exposta no museu

Tivemos o privilégio de uma visita guiada, que foi monitorada pelo estudante de história e responsável do museu, Clécio Lopes da Silva. Na parte interna mostrou peças abrigadas que pertenceram à família do empreendedor Delmiro Gouveia, vários artefatos, fotos da família e da ferrovia quanto da antiga fábrica de linhas, além de equipamentos utilizados na estação.

byClécio Silva

A antiga locomotiva de motor elétrico é uma das valiosas peças em exposição na área externa

Na área externa, encontram-se expostos uma prensa, troller, uma antiga locomotiva com 136 anos de uso, motor elétrico que ainda funciona e um anfiteatro.

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(C) Lada Niva da montadora russa estacionado na saída da cidade; o veículo foi um dos primeiros carros estrangeiros a desembarcar no país na era Collor de Mello

Em seguida, retornei à AL-220 em direção ao entroncamento do povoado Olho d’ Água do Casado, depois peguei a AL-225 – rodovia Altemar Dutra, sentido Piranhas.

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Sinalização em pórtico na rodovia AL-225 indica que a cidade de Piranhas é Patrimônio Histórico Brasileiro

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Entrada da cidade de Piranhas

No ano de 2003 Piranhas foi tombada como Patrimônio Histórico Brasileiro. O pórtico histórico na entrada é o primeiro cartão postal da cidade, que está localizada às margens do rio São Francisco. Da parte alta, o visitante tem uma visão exuberante do lugar, com seus casarios em estilos de predominância neoclássicos, datados dos séculos XVII e XIX. Mais abaixo, do lado esquerdo, a escultura do peixe piranha, em homenagem ao nome da cidade.

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Conjunto arquitetônico colonial bem conservado

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(C) Escultura do peixe piranha em alusão ao nome da cidade

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Museu do Sertão funciona na antiga estação ferroviária

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Estátua do cantor Altemar Dutra

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Antiga locomotiva em exposição na área do mirante

Em frente, destacam-se a torre e a antiga estação ferroviária, local onde funciona o Museu do Sertão. Do lado direito, no mirante – local para contemplar o rio São Francisco e seu entorno -, tem uma estátua do saudoso cantor carioca Altemar Dutra e a antiga locomotiva, que fazia o transporte de passageiros e cargas entre Piranhas e Delmiro Gouveia.

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Shirley (de boné) e o grupo de cariocas

Depois dessa etapa surgiu uma oportunidade de curtir uma aventura que não estava no programa do dia: o passeio de catamarã incluído a rota do cangaço. Agradeço o empenho de um preposto do terminal turístico local, que conseguiu junto ao grupo de cariocas que fechou um pacote, a permissão de nosso embarque.

byShirley Paranaguá

Este blogueiro ao lado do comandante Hugo Araújo

Embarcamos no catamarã Sertão pilotado pelo comandante Hugo Araújo que seguiu em navegação pelas águas do rio São Francisco até o município de Poço Redondo, em Sergipe. Hugo, durante o percurso informa tempo de navegação (mais ou menos 35 min) até a parada no Restaurante Angicos, local considerado como um espaço ecológico e conta “causos” sobre a vida de Lampião. No convés, o grupo carioca não parava de cantar, dançar e agitar o ambiente. Turma muito legal, por sinal!

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Vegetação da caatinga e o Rio São Francisco formam um belo cenário no entorno do Espaço Ecológico

É difícil não se emocionar ao observar o belíssimo visual do “Velho Chico”, sentir a brisa, a formação dos morros de um lado e do outro do rio, a vegetação da caatinga; os relatos das inúmeras histórias de Lampião por aquelas bandas. Aguardávamos com ansiedade o passeio até a Grota do Angico. Após atracar o catamarã na praia da Forquilha, que fica do outro lado do rio, chegamos a um local com estrutura rústica, porém agradável.

A recepção de boas-vindas ao grupo foi feita por duas jovens muito simpáticas com trajes semelhantes usados por Maria Bonita. Já na área do espaço ecológico, depois das acomodações chegou o momento tão esperado do passeio, que é opcional, a ida a Grota do Angico, um percurso realizado pela polícia alagoana quando realizou o massacre que deu fim a Lampião, Maria Bonita e 11 cangaceiros.

Uma turma preferiu ficar. A outra decidiu fazer a trilha, inclusive eu, apesar de estar consciente que a caminhada seria árdua. No exato momento da saída uma chuva muito forte inviabilizou a minha ida e de outros visitantes. Fiquei frustrado! Como diz um ditado popular: “É como ir à fonte e não poder beber água”.

byShirley Paranaguá

Casa onde residiu o coiteiro Pedro Cândido transformada em museu é a última parada no retorno da trilha da Rota do Cangaço

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No interior da casa estão expostos fotografias, armas, móveis, utensílios…

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…o banner em destaque do oficial da polícia militar alagoana responsável pelo massacre do rei do cangaço e comparsas na Grota do Angico e…

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uma foto-montagem com as cabeças de cêra de Lampião, Maria Bonita e os cangaceiros

Mas nem tudo estava perdido. Uma casa de taipa existente na área do fundo, onde morou o coiteiro Pedro Cândido, transformada num pequeno museu, guarda valiosas lembranças daquele período. Chama atenção o banner fixado na parede da sala com a foto do tenente João Bezerra e texto informativo da ação da polícia de Piranhas a respeito da morte do cangaceiro ora retratado como matador impiedoso ora como herói da caatinga.

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Curtição do ski bunda ou escorregador é o banho na prainha nas margens do Rio São Francisco

Na área do parque minhas filhas se divertiam no “ski-bunda” ou escorregador, uma lona colocada na encosta até a prainha nas margens do rio (Clique aqui e assista o video).

byLuciana Rodrigues

Este blogueiro e a família degustando um dos deliciosos pratos típicos servidos no restaurante

No retorno do grupo, enquanto ouvia os relatos e reclamações de casanço da caminhada, sentamos para saborear o pedido “Pirão Angico Filé”, bem peculiar do Sertão, antes de começar a trilha, sugestão da proprietária do restaurante Luciana Rodrigues, sobrinha neta do coiteiro Pedro Candido. Saboreamos um delicioso prato servido com filé de peixe surubim frito, pirão, farofa cangaceira, molho de macaxeira (aipim), feijão tropeiro, arroz e vinagrete, acompanhado de rosca de morango, suco e uma sobremesa caseira geleia de xique-xique (cactos). Uma delícia!

byJFParanaguá

O visual do entardecer navegando no rio São Francisco…

byJFParanaguá

…contornado por morros é inesquecível

De volta à embarcação, retornamos a Piranhas. Já era final de tarde, o tempo passou e nem percebemos. Mas, afinal, para que relógio se a pretensão é que não se passe as horas quando se está num paraíso. E que paraíso! Do convés da embarcação contemplamos o belíssimo cenário proporcionado pelo entardecer, a exuberância do “Velho Chico” rodeado pelos morros de paredões rochosos cobertos pela vegetação da caatinga. Uma maravilha! Agradecemos a Deus por esse privilégio!

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Saindo de Canindé de São Francisco, uma placa de sinalização no final da serra indica o sentido da Usina e do Museu

byIrani Paranaguá

Estátuas de Lampião, Maria Bonita e um vaqueiro no canteiro que contorna o acesso para o Museu e a Usina

No terceiro dia fiz o seguinte roteiro em direção ao Museu de Xingó, localizado na cidade Canindé de São Francisco, Sergipe: Saí às 8h30min de Paulo Afonso pela BA-210, rodei 4 km na BR-110, sentido sul da Bahia, até o entroncamento com a BA-210, que fica à esquerda da rodovia. Ainda na BA-210 rodei (20 km) até a divisa BA/SE e mais 36 km até o entroncamento da SE-230/330, à esquerda da rodovia. Desse ponto foram mais sete quilômetros, sendo: cinco até a cidade de Canindé de São Francisco e mais dois até o Museu de Arqueologia de Xingó, com tempo de 1h10min, totalizando aproximadamente 75 km.

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Viista parcial da área externa da Usina Hidroelétrica do Xingó

byShirley Paranaguá

Vista parcial do prédio do Museu de Arqueologia do Xingó

O Museu de Arqueologia de Xingó (MAX), da Universidade Federal de Sergipe (UFS), está situado na área da Usina Hidroelétrica e foi criado no ano de 2000 com a missão de pesquisar, preservar e expor o patrimônio de Xingó, que quer dizer em tupi-guarani “Água que corre entre pedras”. O trabalho desenvolvido pela UFS, com apoio da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf), realizando o salvamento arqueológico na área que seria inundada pelo reservatório, permitiu identificar a existência de uma cultura xingoana na região, há pelo menos 9.000 anos atrás.

Fiquei muito emocionado quando cheguei ao MAX. Os motivos são justos. O meu amigo e professor de arqueologia do Centro de Estudos das Ciências Humanas (CECH), Ivan Dórea, sempre me incentivou a vistar o local. Também o meu colega arqueólogo e parceiro de trabalho Jarryer Pinheiro no Museu Arqueológico da Embasa, do qual estou coordenador, faz referências ao museu e descreve com detalhes o espaço. Foi muito proveitosa a visita!.

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A visita guiada com o monitor Fábio (camisa preta) no interior do museu foi muito enriquecedora

O museu funciona em um prédio moderno construído no meio do sertão. Através da visita guiada monitorada por Fábio, tivemos a oportunidade de aprender um pouco sobre a história, dos projetos de salvamento e dos sítios arqueológicos. Explicações com detalhes sobre as imagens, objetos líticos (ferramentas feitas com pedras), cerâmicos (feitos com barro), fósseis, urnas com esqueletos intactos – entre eles, um esqueleto de quase nove mil anos., além das instalações cenográficas com recriações em tamanho real. A diversidade de peças é muito grande.

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Momento em que o monitor Fábio segura a peça…

byShirley Paranaguá

…este blogueiro com a panela nas mãos

Todo acervo está disposto em uma exposição de longa duração. Fomos surpreendidos coma atitude do monitor Fábio ao retirar uma panela de cerâmica de 3.000 anos atrás de um display e pedir para que cada um de nós segurasse a peça. O ato não é muito comum em museus. Mas, lá, é uma prática, possibilitando que o visitante/turista possa ter contato com tão valioso acervo. Outro fato relevante: na região de Xingó foi descoberto um dos maiores sítios arqueológicos -Justino – com enterramentos humanos pré-históricos do Brasil.

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À esquerda, um dos cemitérios em que foram resgatados os restos mortais para construção da usina

Depois desse rico aprendizado, nosso destino era almoçar na cidade e, no retorno, irmos até o povoado Rio do Sal, fazer o passeio de catamarã no rio São Francisco. Mas uma dica modificou nossa programação. Ficamos sabendo do passeio para o Paraíso do Talhado que sai do Porto Karrancas, localizado no dique da barragem da Usina Hidroelétrica de Xingó, que fica a 3 km do museu.

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A entrada para o Restaurante Karrancas dá acesso a área de embarque e desembarque das embarcações

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Embarque no catamarã Frei Damião no Porto Karrancas

Seguimos imediatamente para o porto, porque estava previsto a saída às 14 horas do último catamarã do dia. Nessa nova aventura a expectativa era de uma curiosidade enorme: Observar a vasta extensão de água que mais parece um mar em pleno semi-árido e conhecer o tão badalado Cânion de Xingó.

Durante a manobra do catamarã Frei Damião, comandando pelo capitão Geraldo e a tripulação formada pelos marinheiros Dedé (convés superior), Jailton e Jacó (convés principal), o guia de turismo da empresa de navegação iniciou os procedimentos de segurança que são passadas com demonstrações pela tripulação.

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As formações do rochedo “Pedra do Gavião” e…

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…o do “Morro dos Macacos”, são criações da natureza

Enquanto a embarcação sobe o rio, ao som do ritmo do forró, pra não fugir as raízes, e da música popular, o guia explica o significado das principais formações rochosas, como por exemplo, a Pedra do Gavião, o Morro dos Macacos, a Pedra do Japonês e o Paraíso do Talhado, no Sítio Arqueológico de Justino.

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A paisagem com paredões de rochas graníticas e as águas esverdeadas do rio São Francisco encanta aqueles que passam pela região

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Gruta com imagem de São Francisco de Assis no trajeto do passeio

É impossível não se encantar com a paisagem rústica em contraste com a imensidão das águas esverdeadas do rio São Francisco (Velho Chico), que foi descoberto em 4 de outubro de 1501, pelos viajantes Américo Vespúcio e André Gonçalves e recebeu esse nome em homenagem a São Francisco de Assis.

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Vista panorâmica do porto de Brogodó/Paraíso do Talhado

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O ponto alto do passeio ao Paraíso do Talhado é tomar banho no Rio São Francisco; acima, área reservada para adultos e, no centro, a piscina para crianças

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MInhas filhas curtiram o banho na pisicina

Após uma hora de viagem, o catamarã chega ao porto de Brogodó no “Paraíso do Talhado”, uma gruta com imensos paredões de pedra. Chegou a hora da diversão: tomar banho nas águas do rio São Francisco. Minhas filhas, além de outras crianças e adultos tomaram banho numa piscina na área do deck com um metro de profundidade e tela de proteção no fundo. Em outro espaço reservado e mais fundo, os turistas aproveitaram para mergulhar sob a observação dos salva-vidas.

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O passeio de barco…

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…a imagem de São Francisco de Assis…

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…e a gruta do Talhado

Como não quis tomar banho, escolhi o passeio completar de barco a remo (R$10 por pessoa) e chegar mais próximo dos canyons, onde as embarcações maiores não podem entrar. Paredões com diversas tonalidades, imagens de São Francisco de Assis em meios aos rochedos, formam um cenário espetacular e que nos leva a refletir o quanto a natureza é perfeita. Duas horas depois chegamos ao porto de Karrancas, local do desembarque. Imperdível o passeio!

De lá retornamos a cidade de Paulo Afonso para recuperar as energias e retomar a viagem no dia seguinte com destino a cidade de Caruaru, em Alagoas.

(Fotos: byJFParanaguá, Irani Paranaguá, Iamani Paranaguá e Shirley Paranaguá).

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