O grafiteiro Eder Muniz (foto acima), tem um trabalho plasticamente diferenciado, com muito lirismo e com apelo a natureza. Suas pinturas também são muito instigantes, a ponto de provocar admiração e indagação dos que observam os grafites estampados em diferentes suportes da cidade. É considerado um artista com várias vertentes e influenciado em especial pela natureza. “Eu não me limito a uma coisa só. Sou pirado no surrealismo e no abstrato, adoro coisas excêntricas e coisas vibrantes”, explica Muniz. No seu entendimento o grafite sempre foi uma forma de manifestação de voz com a comunidade. Em 2000 criou com Marcelo Verme o Movimento denominado Calangos de Rua. Em 2010, o Movimento se extinguiu e ele passou a assinar Calango, em alusão ao animal de origem do Nordeste, com características a mutação da cor e velocidade. (Direitos reservados. Denuncie abusos. Fotos: byJFParanaguá e Eder Muniz). Confira a entrevista:
A Arte na Rua – Como foi o seu contato com a arte?
Eder Muniz – Desde pequeno eu já desenhava. E acho que o que marcou mesmo foi pintar a casa de uma tia chamada Luiza em Tancredo Neves. Recordo-me que ela gritou: “Você fez isso? Pichou minha casa?” Aí eu ouvi pela primeira vez a palavra pichação: Você pichou minha casa! Com a idade entre 11 e 12 anos comecei a notar nas ruas as pichações, passando no transporte ou no meu bairro mesmo.
AAR – Você é filho único ou tem outros irmãos?
EM – Tenho mais dois irmãos. Meu pai na tentativa de ter uma filha acabou tendo três homens (risos).
AAR – E na tendência artista quem você seguiu?
EM – Na família quem assumiu foi eu. Não tive influência, apesar de ter uma tia no interior que trabalha com pintura em tecido, mas por hobby. Minha mãe também desenha e costura muito bem. Acho que se ela tivesse se informado mais poderia ser uma estilista, mas essa questão da oportunidade que não houve limitou-se a executar o que as pessoas pedem.
AAR – Você passou pela pichação?
EM – Passei com orgulho (risos). Passei com orgulho reafirmo. Comecei a pichar com 16 anos a minha escola. E venho de uma educação evangélica com muitas doutrinas.
AAR – O que você quer dizer com isso?
EM – Desde a primeira série. Na época, minha mãe me colocou pra estudar na Escola Batista lá do bairro que era a que tinha melhores condições. O uniforme era calça com camisa por dentro, sapato social, vistoria das unhas e do cabelo. Estudei até a quarta série, depois fui fazer o ginásio numa escola espírita, por conta também de ser uma escola boa.
AAR – Você teve algum problema de religião nessas escolas?
EM – Rapaz, a minha família é Católica, mas Católica sempre joga também dos dois lados (risos). É de angola…
AAR – As religiões se identificam?
EM – Pô! A gente vem de uma classe média pobre, não é? Então tem que lidar com o que tem. A gente não tem escolha. Eu era muito jovem e pichei o colégio todo, resultando na minha expulsão. Acabei indo estudar na escola pública Edvaldo Brandão, em Cajazeiras IV. Chegando lá foi um choque cultural muito grande pra mim. Imagine, eu passei por duas escolas com doutrinas, uniformes padronizados e quando eu cheguei o pessoal usava roupa de marca, da moda… de griffe. Roupa de surf. Então tinha essa coisa. E aí o pessoal me alugava, me escaldava, dizendo que parecia que eu ia pra os quinze anos. Isso porque eu me vestia fora dos padrões da escola.
AAR – Você sofreu algo parecido como bulling da época?
EM – Era. Também eu ia com a roupa do colégio evangélico e espírita (risos), mas me identifiquei logo com a galera porque pichava e gostaram do que viram no meu black book. A partir daí surgiu a oportunidade de entrar numa gang de Cajazeiras VI.
AAR – Qual era o nome da gang?
EM – GDM. Mas não lembro o significado.
AAR – Qual era o seu tag?
EM – Por um tempo foi Caia. Era de uma letra de Bob Marley. Depois fui pesquisar e descobrir que o significado era “cannabis”, ou seja, maconha (risos). Então Caia não se identificava comigo.
AAR – Em que ano foi isso?
EM – Entre 96 e 97. Aí passei a divulgar algumas vezes o nome da gang. Mas nunca fui bom em divulgar coisas dos outros, ou melhor, reproduzir com fidelidade. Não deu muito certo. Então decidi sair e como já vinha pichando procurei criar a minha própria gang chamada de Gaviões (risos).
AAR – Quer dizer então que você era o personagem?
EM – Isso mesmo. Porque não tinha que aguardar por alguém, reunião, convocação…
AAR – Você tomava a decisão de sair na hora certa e sem ter que prestar satisfação a ninguém. E os “pixos” você fazia onde? Dilapidou patrimônios públicos ou riscou muros, paredes de escolas e de residências?
EM – Na verdade, pichei alguns mercados, algumas igrejas…
AAR – Sua pichação começou com ondinhas? Como foi o primeiro risco?
EM – Naquela época os letreiros eram outros. Cada grupo tinha o seu próprio letreiro. Não é o que se aplica hoje em dia que é um letreiro praticamente único pra todas as gangs. O pichador tinha que ter identidade, personalidade no seu trabalho.
AAR – Qual era o “pixo” preferido?
EM – No começo não eram frases de protestos. Mas pichava o tag Caia com o nome da gang.
AAR – Sua tag?
EM – Sim. E fazia grande, porque quanto maior mais era visto. Eu não cheguei a pichar no Centro.
AAR – O seu bairro era o local preferido?
EM – No bairro e perto da escola onde estudava em Cajazeiras. Mas esse tempo durou dois anos e meio. Fiquei reconhecido no bairro e pichei com outros pichadores. Por volta do início de 2000, conheci o pichador chamado Marcelo “Verme”, muito famoso na cidade, inclusive, na época, Varela (apresentador de TV) o procurava através do seu programa.
AAR – Verme também foi pichador?
EM – Verme é o pichador.
AAR – Continua sendo pichador?
EM- Não. Ele não picha mais. Parou de pichar por conta da idade. Já tinha mais de 18 anos. Mas a história… Quem conhece pichação e grafita na cidade vai lembrar-se dele claramente. Por exemplo, Sinal, que era discípulo e reconhece o trabalho dele. Ciborg também. Pinel, com certeza reconhece o trabalho de Verme. Quando o conheci e viu o meu caderno de desenho, disse-me: “Pô Eder! Tem que grafitar velho! Tem que grafitar!”. Ele já grafitava. O primeiro trampo que a gente marcou foi no muro de propriedade de uma empresa de galpões localizada na entrada de Pau da Lima – cruzamento para Cajazeiras, Castelo Branco, Dom Avelar, São Marcos e São Rafael. Na época conseguimos autorização da gerência da empresa pra pintar, porque fomos pedir na companhia da professora de arte da nossa escola. Também a gente queria fazer uma coisa pra ficar à vontade, sabe. Já tínhamos um ideal de não fazer letras, queríamos desenvolver temas. Estávamos querendo fugir da cultura Hip Hop da época que imperava muito no grafite. O grafite era muito ligado ao Movimento Negro de Salvador, Movimento Hip Hop de Salvador. Quero deixar bem claro que não foi um desrespeito da minha parte, mas eu não queria me envolver, porque achava que todo mundo fazia a mesma coisa. A gente queria ter um trabalho diferenciado. Então, a gente começou pintando o êxodo rural, por conta dos meus pais e os de Marcelo que vieram morar em Salvador. O pessoal do grafite realmente ficou de cara com o trabalho. Os grafiteiros Lee e Neuro, ligados ao Hip Hop, quiseram saber quem foi que fez o trabalho. Já havia acontecidos eventos nessa época de grandes painéis com a participação de dez a doze grafiteiros, onde a nova escola não era convidada. E mais: a gente ainda tinha que provar a qualidade dos nossos trabalhos.
AAR – Vocês eram considerados da nova escola?
EM – Claro. Nós não tínhamos ainda história nenhuma com o Movimento Hip Hop ou com a cultura alternativa. Eu já havia tido a oportunidade na escola de me envolver com o teatro, com a música. Essa é uma discussão que rola depois. Por que o cara picha? A falta de cultura é uma grande influência, não é velho? O pessoal acusa o pichador, mas não procura ver as vertentes, porque isso acontece, não é? Claro que tem muitos que picham por vontade particular. Mas a maioria não teve essa oportunidade.
AAR – Então, qual a explicação?
EM – Todo mundo velho, tem uma expressão artística e quer se expressar de alguma maneira. E a pichação é a forma mais dinâmica de fazer isso, de aparecer.
AAR – Você já falou como chegou ao grafite, sobre sua trajetória no início de como começou pintando com Verme. Você pensava nisso como uma manifestação poética ou como curtição?
EM – Rapaz! Não acontecia como curtição, porque sabia o sacrifício pra conseguir o material, da postura que tinha que ter e da correria pra poder fazer aquilo acontecer. Quando a gente começou pintando autorizado, tinha toda uma documentação, chegar até a empresa, convencer aquela pessoa. Então pra mim nunca foi curtição. Na verdade, eu sempre entendi o grafite como uma forma de manifestação, sabe? De manifestação de voz com a minha comunidade. A ideia nossa era essa. Verme já tinha uma consciência crítica muito grande, mas eu era imaturo ainda. Ele já me guiava e sabia o que queria. E ver essa postura dele me influenciava muito.
AAR – No período que você fez grafites no bairro, como foi a reação da comunidade?
EM – Foi muito positivo. Claro que o grafite naquela época não era tão divulgado e bem visto como é hoje. Muitas pessoas xingavam, enquanto outras criticavam. Mas, no geral velho! Só quem desrespeitava o grafite mesmo era o político (sic). Se ligou? O cabo eleitoral que chegava lá sem nenhum respeito e pichava por cima. Esse era o real pichador. Pra mim, são os caras da política, dos cartazes, dos autdoors, que poluem.
AAR – Em 2010, no período eleitoral publiquei uma nota no blog com um trabalho seu no Vale do Ogunjá, referindo-me a questão da preservação da obra de arte, inclusive sugerindo aos políticos que orientassem suas equipes a não colocarem as propagandas por cima dos grafites.
EM – Tô ligado! Um moradorde rua tocou fogo no ferro velho e manchou o trabalho. Mas não é bem assim. Começou a campanha e já destruíram vários lá no bairro. Perdi três trabalhos.
AAR – O quê você esperava com a manifestação de voz?
EM – Eu esperava gerar uma discussão, um diálogo com a comunidade sobre os sistemas, os problemas da educação, da falta de cultura. Esses problemas da comunidade acabam sendo tocados, ficam no inconsciente. Existem várias coisas, por exemplo: o valor dessas pessoas que vem do campo, o valor do trabalhador. Depois surgiram outros temas como o sexo e as drogas. Tudo isso é pouco discutido. A ideia era abordar esses temas.
AAR – Nos grafites também?
EM – Sim. Nos meus trabalhos e de Verme, que era uma galeria a céu aberto como a gente trabalhava. Depois apareceu Tial, mas a fundação mesmo era de nós dois. A partir daí, foram surgindo resultados, uma reação positiva da comunidade porque a gente começou a fazer eventos culturais reunindo vários grafiteiros no Dia das Mães e Dia das Crianças. Convidava amigos que trabalhavam com arte, com cultura teatro e poesia. Vamos supor: o cara sabe tocar e tem uma banda no bairro se apresentava. A gente conseguia estrutura, apoio de comerciantes, até de vereador. A gente não queria só o grafite, queria todo movimento cultural do bairro presente. O grafite nunca foi o foco principal da coisa, fazia parte do contexto.
AAR – Você ainda considera esse movimento importante para sua vida de artista de rua?
EM – Considero muito importante velho! Eu acho que ter essa voz na rua é um privilégio e saber valorizar essa voz na rua é um aprendizado muito grande. Você nem imagina quem vê o meu trabalho. Às vezes eu ouço as pessoas comentarem entre si. Então, quero ter esse discernimento e a compreensão pra poder fazer mais coisas que eu sei que isso é muito poderoso.
AAR – O que representa o grafite para você?
EM – Vida! Vida, porque eu a cada dia me surpreendo, não com o meu trabalho, mas com o geral, tipo você chega num lugar e vê aquela parede branca ou que esteja suja. Ali tem um ser, tem uma coisa, tem uma cor, forma que faz você pensar, distrair e te levar pra outro plano, te emocionar. Então pra mim isso é vida, velho! Tudo o que nos faz sentir é vida!
AAR – Qual o significado de Calangos de Rua ou Calango? Existe alguma diferença entre um e outro?
EM – Existe diferença sim. Calangos de Rua foi um movimento criado por mim e Marcelo Verme no final de 2000, com a ideia de valorizar o pessoal nordestino. Já Calango aconteceu quando do meu retorno a Salvador em 2010. O Movimento praticante se extinguiu por conta do tempo, todo mundo passou a constituir família, começou a trabalhar. As pessoas ficaram sem tempo de se envolver nos movimentos sociais. Refiro-me às pessoas que trabalhavam comigo na época. Então fiquei só. Aí deixei de assinar Calangos de Rua e passei a assinar Calango. Acredito que só deveria ser Calango no singular, porque não ia abranger tudo o que eu faço: acordar cedo pela manhã, arrumar o material, pegar um ônibus cheio, escolher o muro, dialogar com o cara do muro, tirar foto, postar a foto. Sabe, toda essa preocupação é demais para uma pessoa só. Daí ser Calango e não Calangos (risos). Calango é um animal endêmico do Nordeste e tem como características a mutação da cor e velocidade.
AAR – Como você classifica o seu estilo artístico?
EM – Paranaguá tem várias vertentes. Eu não me limito a uma coisa só, ainda bem. Eu não acho que criei uma fórmula para o meu trabalho e me influencio por várias coisas, mas em especial a natureza. Sou pirado no surrealismo e no abstrato, adoro coisas excêntricas e coisas vibrantes. Pra a mim a influência da pintura Latina e da América do Sul influenciam muito o meu trabalho, as cores principalmente. Então eu acho que não tem uma definição exata, mas uma mistura de… um mix de culturas. Eu chamo isso de um trabalho cosmopolita, que bebe do mundo.
AAR – O quê você quer passar nos seus grafites?
EM – Acho que a mensagem maior é espiritual, do cuidado que a gente tem que ter com o outro. Quando a gente fala o outro liga muito ao ser humano, mas do ambiente. Pra mim o ambiente é o outro. Quando você respeita o meio ambiente, você ama o outro. Porque se alguém sabe preservar aquilo ali a outra pessoa também vai fazer o mesmo. Sabe que vai dar certo aquilo ali. Então, acho que é por aí.
AAR – Você desenvolveu muitos estudos até chegar a sua fase atual?
EM – Ainda faço. Pesquiso muito. Eu não sou de academia (Escola de Belas Artes), nunca frequentei e não tenho a pretensão também. Tenho o maior respeito por quem já frequentou e concluiu o curso. Mas sempre tive bons amigos ao meu redor, pessoas mais velhas do que eu, como meu pai e minha mãe. Então, isso me influencia muito. Por exemplo, como adquirir sabedoria com essas pessoas e me incentivar no estudo. Não é que vou sentar e estudar sobre a história da arte, mas, dando um exemplo, vou trocar ideias com você abertamente e chegar a um ponto de adquirir conhecimentos com você. E isso eu gosto de fazer muito.
AAR – Trocas de experiências?
EM – Com diversas culturas. Sabe por quê? Eu acho que o trabalho não vai beber só de artes visuais. Não velho! Tem de viver de dança, de música, de cinema. Essa é viagem! Se viver só daquilo ali está limitado.
AAR – Como você se define: artista plástico, grafiteiro ou arte-educador?
EM – Depende do projeto (risos). Se por exemplo um edital quer que diga artista plástico sou um artista plástico.
AAR – Então como é uma apresentação sua?
EM – Não sei velho! Eu estou fazendo arte. No momento trabalho com material do spray, massa acrílica, tela, madeira, metal. É um trabalho visual. Eu quero partir pra o 3D e escultura. Ainda não é o tempo, mas estou estudando pra isso.
AAR – Quando você participou do Projeto Salvador Grafita?
EM – Entrei em 2005. Na verdade eu fui abordado quando estava pintando um muro com Marcelo Verme por dois policiais civis que andavam à caça de pichadores. Eles chegaram com algema e arma em punho numa abordagem bem radical. Mas a gente não se preocupou porque estávamos com a autorização mais recente em mãos. A preocupação nossa era de renovar sempre a autorização pra pintura do muro. Eles ficaram de cara ao ler o documento e sem argumento não puderam prender a gente. Aí ligaram imediatamente pra Edvandro “Tucanaré”, que era o diretor do Projeto, comentando que pegou a gente fazendo uma pintura autorizada. Depois nos passaram a notícia de que foram orientados a encaminhar a gente para o Projeto Salvador Grafita. A apresentação foi na Limpurb. Como só existia uma vaga Marcelo cedeu pra mim. Participei de algumas pinturas com o grupo. No início de 2007 conheci a urbanista nova-iorquina Carly Fox que veio a Salvador pra me entrevistar no projeto.
AAR – Você esteve em Nova York? Conte um pouco sobre a sua experiência por lá?
EM – Viajei com Denis Sena. Carly organizou muita coisa em Nova York. Começou como uma brincadeira, uma paixão, mas Carly por ser uma pessoa bastante profissional levou a coisa a sério. A gente palestrou na Universidade de Nova York, em Manhattan, uma das maiores universidade dos Estados Unidos. Em Cornell, outra universidade do interior de Nova York. Participamos do Movimento Contra a Guerra, pintamos em Manhattan, no Brooklin e em Queens. Ela também organizou palestras pra gente pagar a comida e estadia durante dois meses e pouco que ficamos morando na casa dela. Assim que eu voltei, sai do Projeto Salvador Grafita por razões pessoais.
AAR – Você sendo artista da velha escola qual foi a sua contribuição para os jovens no período em que participou do projeto?
EM – Acho que a minha contribuição mesmo foi com atitude, velho! Sempre tive vontade de trabalhar e de ajudar, mesmo com as dificuldades da época.
AAR- Depois de um período em Salvador você retornou para Nova York. Como foi essa nova experiência?
EM – Acho que foi muito boa e forte pra mim. Realmente meu trabalho evoluiu muito nessa época, por conta do grafite ainda ser proibido em Nova York. Eu tive que pintar muitas telas em casas pra mostrar nas exposições. Isso me levou a aprimorar outras técnicas, fazer outros estudos e também na questão das informações sobre publicações de grafites disponíveis nas livrarias, bibliotecas, além de outras pessoas que estudavam arte. Um fato interessante me chamou atenção: Percebi que as pessoas não são orgulhosas, vivem mais e dividem mais. Em Salvador, isso não acontece. Quando alguém chega num patamar mais ou menos, as pessoas não dividem mais com você. Pensa só nela. É ela, ela e ela. Lá as pessoas…
AAR – Eles compartilham?
EM – É velho! As pessoas continuam compartilhando. Então isso me influenciou muito lá fora. Mas também comecei a sentir muita falta da cultura de Salvador. Refiro-me ao natural de Salvador, tipo assim: de acordar e ver minha vista preferida, saber das árvores, das aves. Isso me atingiu muito. Pra compensar essa falta comecei a explorar muito isso. Meu trabalho começou a ter um cunho social muito mais voltado para o meio ambiente. Comecei a entender que a…
AAR – A fauna e a flora deveriam ser exploradas?
EM – Foi. Porque a urgência da nossa época agora é o meio ambiente. O tema preferencial é esse…
AAR – A sustentabilidade também é um tema que está presente.
EM – Tudo isso ai velho. E a gente tem de acordar pra isso ai também.
AAR – Na época, você publicou no seu Fotolog alguns grafites pintados usando containers como suportes.
EM – Sim…
AAR – Foram trabalhos particulares ou espontâneos?
EM – Os grafites foram pintados num Parque Comunitário no meio de Manhattan. É um evento que acontece sempre. Tem o objetivo de reunir no Parque pessoas ligadas a cultura alternativa, como: skatistas, grafiteiros, artesões. Também são montadas feiras e jardim comunitário, tudo pra comunidade e sem muito dinheiro do governo envolvido. O container que você se referiu foi de um amigo chamado Nando, que permitiu a gente pintar na parte externa. Também nesse espaço apresentei meus trabalhos após a partida de Denis para Salvador. Peacetu quando esteve em Nova York, apresentei-o a Nando, que lhe deu total apoio para cortar todas as peças das esculturas a serem expostas no Parque.
AAR – Como você vê o cenário do grafite em Salvador, antes e hoje?
EM – Quando você perguntou o que me influenciou no Projeto Salvador Grafita, reconheço que teve fase positiva e negativa também. Eu vejo uma galera também muito mais acomodada, esperando por evento pra pintar. Na época que comecei havia escassez de eventos, mas havia muito mais atitude da galera de invadir os espaços pra fazer o trabalho.
AAR- – Recentemente li o comentário de um grafiteiro de Salvador, cobrando essa falta atitude dos grafiteiros locais. “Estão parados”. O desabafo reforça o que você falou anteriormente?
EM – Pois é velho! Posso contar quem são as pessoas que trabalham em Salvador. Posso dizer as constâncias deles também. Não sei quem trabalha, mais é uma vez por mês. Ou de dois em dois meses, ele vai à rua. Também tem muita gente que adquiriu maturidade e constituiu família…
AAR – Passou a fase da adrenalina de estar na rua?
EM – Concordo. Mas, os problemas sociais continuam e…
AAR – Eder tem muitos artistas que começaram a ter uma visão diferente do grafite. Certa feita li a seguinte definição de um grafiteiro paulista: “Você gosta de fazer isso, mas tem que estar na rua, porque o grafite é vida.” Qual a sua opinião a respeito?
EM – Isso também é a minha política. E acho que em Salvador, infelizmente a galera se limita e a política é estar na rua. Pintar na rua já é uma atitude, pintar na rua seja o que for já é uma atitude. Pô velho! É consciência. Somos ofendidos diariamente com a corrupção em Salvador e no Brasil, com a falta de infraestrutura, falta de educação e ninguém não vai fazer nada? Vai simplesmente pintar uma carinha com uma lata de spray na mão? Esse cara ta falando o quê pra aquele meio em que ele vive? O quê, por exemplo? É mais um trabalho vazio na rua com influência européia que não precisa de educação, porque já tem, não precisa de cultura porque já tem.
AAR – O que falta para acontecer o fortalecimento dos grafiteiros?
EM – Quando eu retornei de viagem, voltei através do romantismo, com vontade de reunir todo mundo, fazer pinturas coletivas, pintar com a galera. Eu sou muito democrático, sabe?
AAR – Nas minhas andanças pela cidade já encontrei você pintando sozinho ou com um ou dois grafiteiros ou até de outro país. Você gosta de pintar sozinho ou com um grupo de amigos?
EM – Pinto e gosto dessa interação. Mas, em Salvador, infelizmente a cultura não é de apoiar o outro. Aqui é geral e tem várias vertentes. Não é só na arte. O negócio é eu por eu e isso aí não fortalece nada. Porque sozinho brother tudo é muito mais difícil. Então, volto pra Salvador com a ideia, eu e minha mulher, de fazer um livro pra que a gente consiga uma bolsa de estudo. A gente começa nesse processo de fazer um livro na correria. Pô! Tudo é muito bom no começo, porque não tem intriga. Depois é que você fica sabendo das pessoas com quem está lidando. Surgem as intrigazinhas, fofocas de coisas, porque alguém tem uma coisa a mais. (Sic)! Então percebo que a causa é motivada pelo trabalho agora. Por que isso? As pessoas sabem de onde eu venho, sabem onde moro, não cai do céu, não ganhei na loteria. Então, quando vejo um trabalho de Bigod exposto no show do Rapa, eu fico feliz, tá ligado? Quando eu vejo uma matéria publicada de Peace ou Dimak fico feliz. Ou então o Dimak desenhando pro A Tarde fico feliz, ta ligado? Porque eu sei que aquilo ali é um empurrão pra o geral (sic)…
AAR – Uma conquista da galera, inclusive quebrando paradigmas. Como você vê o crescimento do grafite nas galerias de arte de Salvador?
EM – Acho que as pessoas têm que se tornarem profissionais, mas com humildade e urgência também de se envolverem com o circuito das artes de Salvador. Em Salvador ainda é muito limitado, comparando com outras capitais brasileiras, como São Paulo, Rio e cidades de outras partes do planeta. Estamos muito atrasados, mas eu não posso dizer do interesse de cada um dos grafiteiros. Posso inclusive citar até alguns nomes daqui, como Samuca, Tárcio, Dimak, Fael, Marcos Costa, Bigob, Lee, Júlio, incluindo outros também. Essas pessoas citadas estão buscando serem profissionais. Em conseqüência disso vai abrir eventos, galerias, mas pra conseguir reconhecimento é necessário ter trabalhos na rua.
AAR – Fale sobre suas exposições e trabalhos particulares. Como você analisa esses segmentos?
EM – Pra mim uma exposição minha é o segmento dos trabalhos que venho desenvolvendo nas ruas. Eu procuro manter a essência, mesmo sabendo que o suporte é menor, que me permite explorar porque é mais delicado, disponho de mais tempo, mas mantendo a mesma temática. E nas exposições procuro agregar coisas novas.
AAR – Quem lhe contrata define o tema para você explorar? Como no caso das exposições mais recentes: o AMA e Orgânicos?
EM – Velho, é o seguinte: Eu normalmente na exposição trabalho na minha linha mesmo. Não quero agradar ninguém, não faço trabalho comercial pra venda, pra decorar a sala de alguém porque a cor é essa ou aquela. Não quero ter essa preocupação.
AAR – Você quer ter livre arbítrio?
EM – Não. Mas nas exposições sim. Isso é uma coisa que procuro programar e ter num mínimo por ano umas três exposições pra poder explorar outra área do meu trabalho. Agora os trabalhos particulares eu dispenso vários. Eu posso ser até orgulhoso e chato. O cara liga pra mim e diz: “Eder, você faz realismo?” Eu falo, olhe irmão, não é o trabalho que eu venho desenvolvendo. Vou indicar Franklin, porque ele está fazendo muito bem realismo. Então passo o telefone dele. Aí alguém me pergunta: “Eder você faz letra?” Respondo: É só letra? Então a pessoa diz: “Letra ou paisagem.” Eu digo: Olha! A paisagem eu faço. Pra fazer letra vou chamar Baga. Ligo e chamo Baga. Eu acho que…
AAR – Cada um na sua?
EM – Exatamente. Eu faço esse trabalho de realismo, mas não vou gostar. Eu gosto de gozar no final (risos). Gosto de gozar no final brother! Sabe? Eu gosto de sentir o prazer, porque ali sou eu. Não é fulano, ali sou eu mesmo. Então, prefiro passar o trabalho adiante e ganhar o mérito com esse ou outro artista. “Porque foi o Eder que me indicou. Eder foi camarada.” Entendeu qual é velho! Mais adiante o cara vai fazer o mesmo comigo também.
AAR – É uma reciprocidade?
EM – É. Acredito que o raciocínio seja esse: “Porque é um trabalho pra Eder, não vou indicar ele não. Ah! Mas ele me indicou daquela vez. Tenho que pagar. É uma maneira de corresponder. É a lei da reciprocidade”. É o ciclo, não é velho? É assim que eu penso. Mas, às vezes não rola velho. Esse ciclo não roda! (Risos). Eu também faço alguns trabalhos que se encaixam com o meu o estilo, tipo o trabalho da fábrica de chocolate pela AMA. O tema era os Astecas e os Maias, explorando a cultura deles, que era voltada pra o chocolate, serpente e pássaros também, sendo coisas que abordo no meu trabalho, como a questão da natureza, Então tinha tudo a ver com o meu trabalho. Eu não tinha nem do que reclamar. Estava em casa. Tive a oportunidade de agregar coisas novas, adquirir mais conhecimentos, porque o cara, o Diego Badaró me disponibilizou muitos livros interessantes. Pesquisei pra caramba sobre o tema. Quem conhece o meu trabalho e viu sabe que o trabalho da AMA tem coisas similares com o painel, como traços e detalhes, mas nada a ver com o meu trabalho. São coisas novas que agreguei. Eu procuro me adequar, evoluir e quando eu não sei falo claramente. Tem que ser humilde velho!
AAR – Você tem pintado em diferentes lugares, como por exemplo: prédios históricos, como no muro atrás da Pousada do Carmo na Ladeira Ramos Queiroz; fundo de uma barraca de revista na Avenida ACM, próximo ao Iguatemi; parede de uma casa em Cajazeiras, bem distante da via principal. E uma das coisas que sinto dificuldades é a de não poder identificar os grafites que são publicados nas redes sociais, sem citar os locais das obras. E você é um deles. Por quê?
EM – Eu realmente não cito os locais. Esse é o mistério de criar a surpresa.
AAR – Qual o melhor horário pra você pintar? De dia ou de noite?
EM – Em Salvador saio cedo velho! Eu sou um animal diurno. De noite estou na minha caverna (risos). Saio 8 horas quando vou trabalhar e quero está em casa no máximo no final da tarde.
Temos uma área maravilhosa para intervenção artistica:https://www.facebook.com/projetohortasurbanassalvador/?fref=ts
assistindo um documentário sobre ele quero o contato
Jane, fineza manter contato pelo face, através de Eder Muniz. Agradecido pelo acesso ao blog.
Olá Eder
Suas obras são incríveis! As cores, os temas, existe uma harmonia, uma doçura em cada grafite. Parabéns.
Se possível tb quero seu contato.
Abraços, Cida
Cida, enviei sua mensagem para o artista.
JFParanaguá.
Olá! Que artista! Faz de salvador um lugar mais belo! Gostaria do contato do Eder se possível! 🙂
Oi Bianca! Concordo com você!
Artista nato,verdadeiro!Amo e me emociono com seus trabalhos,gostaria do seu contato para ter um trabalho do Eder, pode ser?
Olá,
Gostaria de obter contato do Eder MUNIZ para encomendar um trabalho.
Agradeço apoio.
Maria Clara
Olá,
Gostaria de obter contato do Eder MUNIZ para encomendar um trabalho.
Agradeço apoio.
Betina
Betina, Enviei pelo seu e-mail os contatos de Eder Muniz.
Abraço.
Cada vez que vejo uma obra desse artista maravilhoso fico mais e mais encantada. Gostaria do contato (número de telefone) dele, pois tenho muita vontade de conhecê-lo. Abraços e parabéns pela excelente entrevista.